Saúde

Uso excessivo de telas altera vínculos familiares e acende alerta entre educadores

Especialista em desenvolvimento familiar Celso Aparecido Américo dos Santos aponta que presença digital constante tem reduzido diálogo e ampliado distanciamento emocional dentro de casa

O educador e especialista em desenvolvimento familiar Celso Aparecido Américo dos Santos alerta que o avanço da hiperconexão tem provocado mudanças profundas na dinâmica das famílias brasileiras. Segundo ele, o uso excessivo de celulares, tablets e computadores tem reduzido o tempo de convivência real entre pais e filhos, fragilizando vínculos e aumentando os sinais de ansiedade, desatenção e isolamento. “Vivemos em um ambiente em que as telas informam e divertem, mas também afastam quando não há equilíbrio”, afirma.

A preocupação é respaldada por pesquisas recentes. Dados do Unicef apontam que crianças e adolescentes brasileiros passam, em média, 6 horas e 42 minutos por dia conectados, uma das maiores marcas do mundo. Já estudo da Common Sense Media mostra que 51% dos pais relatam que os filhos “estão constantemente distraídos por telas”, enquanto 36% admitem que também se distraem diante delas quando deveriam interagir com suas crianças.

Para Santos, o impacto é direto no ambiente doméstico. Ele explica que o acesso precoce e sem acompanhamento tem colocado crianças diante de conteúdos inadequados, além de comprometer brincadeiras, movimento e interação com outras pessoas. “As crianças nasceram em um mundo digital e isso faz parte da realidade delas. O problema não está no uso, mas no excesso e na falta de orientação”, afirma. Segundo o educador, estabelecer limites não significa repressão, mas construção de autonomia e consciência. “Crianças precisam de telas, sim, mas precisam ainda mais de chão, de sol e de gente.”

O fenômeno da “presença ausente” — quando pais e filhos estão fisicamente próximos, mas emocionalmente desconectados por causa das telas — é um dos pontos que mais preocupa o especialista. Ele observa que a comunicação mediada por mensagens dentro da própria casa tem substituído conversas diretas e empobrecido os laços. “O celular virou o novo membro da família. Ele está à mesa, no sofá e até na hora de dormir. Enquanto todos olham para a tela, o olhar humano desaparece”, diz. Para ele, retomar rituais como refeições sem dispositivos e momentos de convivência desconectada é essencial para restaurar a atenção e o vínculo.

Quando o assunto é estabelecer limites, Santos afirma que muitos pais cedem por culpa ou receio de contrariar os filhos. Ele defende que impor regras não é um ato autoritário, mas de cuidado. “Educar é ensinar equilíbrio. É preciso conversar sobre o porquê dos limites, não apenas impor regras”, destaca. O especialista recomenda que os pais participem das experiências digitais das crianças, assistindo conteúdos juntos e dialogando sobre o que veem. “A melhor forma de educar no digital é pelo exemplo. O que os pais fazem com suas telas fala mais alto do que qualquer discurso.”

Santos afirma que a educação digital deve ser compreendida como parte essencial da formação humana, e não apenas como controle tecnológico. “Educação digital não é sobre tecnologia, é sobre humanidade. É sobre ensinar nossos filhos a estarem no mundo sem se perderem nele.” Para ele, o processo começa dentro de casa, com a redução das distrações e com o resgate de interações que nenhuma tela substitui: escuta, presença e vínculo.